O Supremo Tribunal Federal decidiu se adiantar na discussão sobre a convalidação dos efeitos da chamada guerra fiscal. Ao declarar inconstitucional uma lei paranaense que concedia benefício fiscal sem autorização do Confaz, o tribunal modulou os efeitos da decisão para a partir da data do julgamento, que aconteceu no dia 11 de março. O relator da decisão foi o ministro Luis Roberto Barroso. O ministro Marco Aurélio ficou vencido por não concordar com a modulação.

Guerra fiscal foi o apelido dado aos inúmeros benefícios tributários concedidos por alguns estados para atrair empresas. A guerra é porque os estado que adotam a prática são os de atividade econômica menos desenvolvida. E o fazem em detrimento dos estados mais industrializados, como os da região Sudeste.

A decisão do dia 11 foi mais uma declaração de inconstitucionalidade da guerra fiscal. O Supremo entendeu que a Lei estadual 14.985/2006, do Paraná, é inconstitucional por violar o artigo 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea “g”, da Constituição Federal. O dispostivo remete à Lei Complementar 24/1975, a qual define que só decisão unânime do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) pode autorizar estados a conceder benefícios fiscais.

O dispositivo paranaense concedida descontos de ICMS a empresas que importassem mercadorias por meio dos aeroportos de Paranaguá e Antonina. A novidade da decisão do Supremo está na modulação.

A inconstitucionalidade da guerra fiscal é uma decisão tão recorrente ao STF que tramita na corte uma Proposta de Súmula Vinculante (PSV 69) sobre o tema. O autor da proposta é o ministro Gilmar Mendes, que não esteve presente ao julgamento da ADI sobre a lei paranaense.

Com a decisão, o Supremo sinaliza como deve se posicionar caso venha a, de fato, editar a súmula. No início deste ano, senadores pediram ao tribunal que a PSV não fosse levada adiante. A reclamação era que há diversos projetos de lei em andamento no Congresso, mas a falta de consenso estava justamente na forma de proibição da guerra fiscal — ou, se a questão for pensada ao contrário, da validação dos benefícios até agora concedidos.

O próprio ministro Gilmar Mendes já havia se colocado contra a edição da súmula sem antes discutir de que forma seria feita a modulação. Com a decisão do dia 11 de março, o ministro Barroso acabou dando pistas sobre como isso vai acontecer.

Boa-fé
De acordo com a ementa do acórdão, a modulação “decorre da ponderação entre a disposição constitucional e os princípios da boa-fé e da segurança jurídica”. Barroso, portanto, pondera que a lei paranaense ficou em vigor por oito anos até ser cassada pelo Supremo. E, se alguma empresa se beneficiou dos descontos em ICMS oferecidos pelo estado com a lei, o fez de boa-fé, segundo o ministro.

A interpretação evita alguns problemas que já se desenham no Judiciário. O Superior Tribunal de Justiça já julgou pelo menos um caso de ação penal aberta pelo Ministério Público contra empresa que se beneficiou de desconto em ICMS concedido no contexto de guerra fiscal.

E a decisão do STJ foi a de trancar a ação. “A guerra fiscal entre os estados não pode ensejar uma persecução penal se os contribuintes, em face do benefício fiscal, recolhem o ICMS segundo o princípio da não cumulatividade e não se valem de artifícios fraudulentos com o fim de reduzir ou suprimir o pagamento dos tributos”, decidiu o tribunal no Habeas Corpus 196.262.

ADI 4.481

Veja a ementa do acórdão:

Ementa:. I. TRIBUTÁRIO. LEI ESTADUAL QUE INSTITUI
BENEFÍCIOS FISCAIS RELATIVOS AO ICMS. AUSÊNCIA DE CONVENIO
INTERESTADUAL PRÉVIO. OFENSA AO ART. 155, § 2o, XII, g, DA CF/88. II. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS
TEMPORAIS.
1. A instituição de benefícios fiscais relativos ao ICMS so pode ser
realizada com base em convenio interestadual, na forma do art. 155, §2o, XII, g, da CF/88 e da Lei Complementar no 24/75.
2. De acordo com a jurisprudência do STF, o mero diferimento do
pagamento de débitos relativos ao ICMS, sem a concessão de qualquer
redução do valor devido, nao configura beneficio fiscal, de modo que pode ser estabelecido sem convênio prévio.
3. A modulação dos efeitos temporais da decisão que declara a
inconstitucionalidade decorre da ponderação entre a disposição constitucional tida por violada e os princípios da boa-fé e da segurança jurídica, uma vez que a norma vigorou por oito anos sem que fosse suspensa pelo STF. A supremacia da Constituição e um pressuposto do sistema de controle de constitucionalidade, sendo insuscetível de ponderação por impossibilidade lógica.
4. Procedência parcial do pedido. Modulação para que a decisão produza efeitos a contatar da data da sessão de julgamento.

Com informações  Conjur e  Cleto Gomes – Advogados Associados
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