A MP 808/17, que regulamentou alguns pontos da reforma trabalhista, perderá a vigência nesta segunda-feira, 23. O texto não foi analisado pela comissão mista do Congresso.
A medida fazia parte de um acordo firmado pelo presidente Michel Temer com os senadores para que acatassem o texto da reforma aprovado na Câmara dos Deputados. Foram apresentadas 967 emendas ao texto apresentado à comissão.
Sem a medida, dispositivos como a limitação do dano extrapatrimonial com base no salário do trabalhador, a negociação individual da jornada 12×36, a possibilidade de gestantes trabalharem em ambientes insalubres, voltarão a fazer parte da realidade do mercado de trabalho.
Para o presidente da Anamatra, juiz Guilherme Feliciano, a caducidade da medida “coroa o triste cenário” inaugurado pela reforma trabalhista.
“A caducidade da MP por decurso de prazo representa claro descaso para com a preservação do patrimônio jurídico social legado pela Constituição Federal de 1988 e confirma o epílogo funesto do processo de desconstrução do Estado Social que segue caminhando, agora com braços abertos para a própria tese do ‘enxugamento’ da Justiça do Trabalho, que já volta a ser entoado por parte da grande mídia. O cidadão deve estar alerta para isto.”
O magistrado recorda também a tramitação em tempo recorde do PL 6.787/16 na Câmara dos Deputados e depois no Senado, já sob a promessa do governo de que as inconstitucionalidades e os excessos seriam corrigidos via vetos e/ou medida provisória.
“Não houve vetos quaisquer e a MP editada pela presidência da República, no apagar das luzes de 2017, agora serve apenas como argumento para que o governo diga que ‘cumpriu a sua parte’. O suposto ‘acordo’ celebrado ao tempo da tramitação no Senado – porque, dizia-se, ‘o Brasil tinha pressa’, – foi flagrantemente desonrado. É preciso que os parlamentares que então votaram a favor daquele texto, fiando-se nesse malsinado ‘acordo’ de correções futuras, reflitam agora sobre o que se poderá fazer, no Parlamento, para sanar as graves distorções que voltarão a vigorar plenamente.”
O magistrado explica que, com a queda da MP, agrava-se ainda mais o cenário de insegurança jurídica inaugurado pela reforma.
“Muito se tem falado sobre a redução do número de ações trabalhistas após a reforma, como se aí houvesse um grande ganho; mas pouco se fala a respeito das razões desta redução. O acesso à Justiça foi tolhido com a edição da lei, notadamente em virtude da gratuidade judiciária fictícia que passou a prever – ponto que foi, inclusive, questionado no STF pela própria procuradoria-Geral da República, estando pautado para o início de maio -, aliada ao novo regime de sucumbência honorária. Muitos trabalhadores agora temem procurar a Justiça do Trabalho por variados motivos, entre eles o temor de sair com dívidas e, por outro lado, o medo do desemprego, em um mercado de trabalho que se torna cada vez mais precário.”
Precarização
A precarização dos contratos trabalhistas é outra preocupação do presidente da Anamatra.
“A reforma trabalhista, piorada com a caducidade da MP 808/17, atinge direitos básicos do trabalhador, como a indisponibilidade absoluta dos direitos sociais fundamentais do art. 7º da Constituição – exceção feita às questões de jornada, de irredutibilidade salarial e de turnos ininterruptos – e o direito pleno e irrenunciável a um meio ambiente do trabalho equilibrado.”
Neste ponto, deixa de valer formalmente a quarentena para os trabalhadores celetistas poderem ser demitidos e recontratados como intermitentes.
Segundo recente levantamento do IBGE, o crescimento de postos de trabalho no Brasil, em 12 meses, deve-se basicamente ao mercado informal. As estatísticas revelam que foram criadas 1,848 milhão de vagas em 12 meses, até janeiro, mas essa expansão vem do emprego sem carteira (986 mil) e do trabalho por conta própria (581 mil).
“O panorama econômico que se desenha põe em xeque a ‘ratio’ da reforma trabalhista, particularmente nas alterações que introduziram modalidades juridicamente mais precárias de contratação. A prestação de serviços de autônomo exclusivo implica em informalidade e o contrato de trabalho intermitente, se permite inflar as estatísticas do emprego formal, pode ser vazio de conteúdo, autorizando meses de contratação sem qualquer salário. Na prática, em situações como esta, a condição social será a mesma de um trabalhador informal.”
Fonte: Migalhas