A competência para legislar sobre matéria ligada à defesa dos direitos do consumidor não autoriza os estados a avançarem sobre as relações contratuais regidas pelo Código Civil. Foi o que decidiu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ao julgar inconstitucional uma lei do estado que concedia descontos ao consumidor que, ao comprar um produto novo, devolvesse o usado. O julgamento foi nessa segunda-feira (7/3).

A decisão atende a um pedido da Federação do Comércio de Bens e Serviços e Turismo do Rio de Janeiro, em uma ação de inconstitucionalidade contra a Lei 4.191, que estabeleceu a política estadual de resíduos sólidos no estado. Em vigor desde 2003, a norma previa, no parágrafo 9º do artigo 22-A, descontos para a aquisição de produtos, tais como pilhas e baterias, pneus, lâmpadas fluorescentes e eletroeletrônicos nos casos em que o consumidor apresentasse o produto usado.

A desembargadora Marilia de Castro Neves Vieira, que relatou o caso, explicou que a Constituição Federal reconhece a competência concorrente dos estados para legislar sobre produção e consumo, assim como acerca da responsabilidade por danos aos consumidores.

Porém, de acordo com ela, tal intervenção deve ser exercida com respeito aos princípios e fundamentos da ordem econômica prevista no artigo 170 da Carta Magna, para não prejudicar o princípio da livre iniciativa. “Assim, é vedado aos estados, a pretexto de veicularem norma em defesa do consumidor, legislar sobre Direito Civil, notadamente sobre relações contratuais”, afirmou.

A relatora explicou que a competência dos estados para editar leis sobre matéria relacionada ao Direito do Consumidor é concorrente e não abrange “a fixação de preços”. É que essa intervenção não pertence ao Direito Econômico, mas ao Direito Civil, cuja competência para estabelecer regras é privativa da União.

A desembargadora afirmou que “não existe peculiaridade regional que dê competência plena ao estado para legislar sobre a concessão de desconto ao consumidor”, ainda mais sem qualquer contrapartida. É que a Lei 4.191 atribuiu ao empresariado um ônus que, pela Constituição, seria do estado.

“Cabe ao estado incentivar a proteção e defesa do consumidor, sendo que este incentivo estatal só pode advir da conta dele mesmo. Incentivar uma atividade ou dar um privilégio a determinado seguimento social, sem arcar com os custos dele advindos, é ‘fazer graça com o chapéu alheio’, exigir que outrem exerça as funções que lhe são impostas pela própria Constituição Federal”, afirmou.

A decisão foi por maioria de votos e ainda está sujeita a recurso.

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Processo 0026000-13.2015.8.19.0000

Com informações Conjur e Cleto Gomes – Advogados Associados